DISCURSOS GASTRONÔMICOS E MACARRÔNICOS

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

O sabor do século XV


Ganhei do amigo e professor de literatura, Fernando Morato, um exemplar raríssimo do livro Um Tratado da Cozinha Portuguesa do Século XV.
Assim como uma propaganda de pasta de dente promete que, ao usá-la você conhece uma nova dimensão de refrescância, essas antigas receitas nos levam a uma (já degustada) dimensão de velhos sabores.
Os textos abaixo são traduções contidas no próprio livro, feitas a partir das cópias originais, quase incompreensíveis de se entender. Perceba como a linguagem do mundo da cozinha mudou, assim como, um pouco da “construção” dos pratos.
Que algum historiador me corrija se estiver errada, mas o Brasil foi descoberto na época do livro, em decorrência da corrida pelas especiarias. Por isso, quase todas as receitas são fartas em cravo, canela, açafrão e demais sabores.
A primeira me lembra muito os ensopadões de Jamie Oliver. As outras, dicas para quem não tem outra coisa na geladeira.

RECEITA DE GALINHA MOURISCA
Façam em pedaços uma galinha bem gorda, e levem-na ao fogo brando, com duas colheres de sopa de gordura, algumas fatias de toucinho, bastante coentro, um punhadinho de salsa, algumas folhinhas de hortelã, sal e uma cebola bem grande.
Abafem-na e deixem-na dourar, mexendo-a de vez em quando.
Em seguida cubram essa galinha com água, e assim que levante fervura acabem de temperá-la com sal, vinagre, cravo-da-Índia, açafrão, pimenta-do-reino e gengibre. Logo que a galinha esteja cozida, derramem dentro 4 gemas batidas.
Tomem uma travessa funda, forrada com fatias de pão e derramem por cima a galinha.

LAMPRÉIA
Limpem a lampreia em água quente, tirando-lhe as vísceras e dando-lhe golpes na carne. Coloquem-na enrolada, numa tigela, e temperem-na com azeite, coentro, salsa, cebola ralada e sal.
Deixem-na em repouso por algum tempo, levando-a em seguida ao fogo.
Depois de bem refogada, deitem-lhe um pouco d’agua com vinagre, cravo, pimenta, açafrão e gengibre.
Cozinhem em fogo lento.

PASTÉIS DE FÍGADO DE CABRITO
Cozinhem fígado de cabrito e ovos. Amassem tudo muito bem, dos ovos só as gemas, adicionando à mistura cravo-da-Índia, canela em pó, e açúcar que adoce.
A seguir, tomem as tripas do cabrito, já bem lavadas, cortando-as em pedaços de uns quatro dedos de comprimento, mais ou menos.
Recheiem essas tripas com a mistura acima, passem-nas pela farinha de trigo e levem-nas a fritar em gordura bem quente, colocando-as a escorrer, logo após, numa peneira com papel pardo.
Por último façam uma calda em ponto alto e passem por ela os canudinhos, que em seguida são postos a secar.
Sirvam-se polvilhados com canela.

FRANGOS PARA OS HÉCTICOS
Criem separados uma dúzia de frangos, cujo único alimento consista de titela de cágado, cozida ou cevada: este alimento deverá ser sempre fresco.
Diariamente, cozinhe-se um frango em pouca água, até desmanchar. Em seguida esprema-se a carne, que saia todo o suco; coem o caldo e levem-no novamente à panela com uma colher de açúcar rosado (mascavo). Deixa-se ferver um pouco, côa-se novamente, e estará o caldo pronto.



Foto: Regina Bui

2 comentários:

Anônimo disse...

q delicia de presente!

Regina Bui disse...

feio é falar mal do presente que EU ganhei, mas meu amigo há de me compreender...