DISCURSOS GASTRONÔMICOS E MACARRÔNICOS

domingo, 19 de dezembro de 2010

Os outros sabores do Natal

Como todo ano, ela começou a organização da festa logo no início do mês. Telefonemas pra cá, convites informais e aquele ânimo cansado por saber de tudo o que vinha pela frente. Lista dos nomes, das receitas, dos presentes, dos cartões e redundantemente lista do que não esquecer.
Durante a semana que antecedia o Natal, o planejamento, o tempo, as férias, os filhos: combustível, cheques, primeira, segunda, shopping, terceira, padaria, supermercado, ré.
Enfeites.
Empório, feira, floricultura, tinturaria, embrulhos, garagem, geladeira.
Recados, e-mails, torpedos, respostas, fé.
Vinte e três: o marido providencia o gelo da festa? A faxineira pode vir amanhã? O filhão chama a Ultragaz? Ai meu Deus, esqueci a manteiga!
Vinte e quatro: descongela, corta, descasca, mexe, acrescenta, lava, tempera, aquece, salga, gela, experimenta, embala. Uma imensidão de travessas e panelas. Pilha de louça suja. Que horas são? Chão molhado.
Ordem, arrumação, corre-corre, vai-e-vem, cansaço, alívio, saudades.
Hora do banho.
O cheiro dos assados reina. Entram em cena os perfumes, as loções, os cremes, a expectativa, as velas, a roupa nova, a espera, a birita.
Música, TV, falatório, risadas, campainha, telefones, latidos, copos, comida.
Mãos cansadas, presentes.
Abraços, abraços, abraços.

sábado, 13 de novembro de 2010

A época certa

Na casa toda, o cheiro do ar  mesclava-se de acordo com o impulso dos ventos: às vezes doce, às vezes salgado. Quando o vento era doce, tinha-se a impressão de que grudava na roupa, como ficavam os dedos da cozinheira enquanto preparava os damascos caramelizados. Quando era salgado, acusava escancaradamente os temperos e os segredos daquelas mãos.
Um labrador cor de mel com chocolate dormia espichado na entrada da cozinha. De quando em quando trepidava o queixo envelhecido, talvez reclamando em sonho o direito do maior osso dos assados. Depois suspirava lento e gemia a paz de causas ganhas.
Enquanto isso, a leitoa encrespava dos banhos de óleo quente.
A galinha dourava com brócolis, cenoura, batatas, pimentão vermelho e funcho – cada um colocado na assadeira a seu tempo.
A farofa estufava na manteiga quente e com ela as passas brancas amoleciam mais depressa que as azeitoninhas portuguesas. Quando mexida no tacho, parecia um mar revolto feito de areia escura.
As verduras da salada ganhavam vida e crocância em água gelada, enquanto esperavam o enxágue seguido de um mergulho novo: suco de dois limões-cravo, alecrim e azeite.
O arroz, esse era esquecido propositalmente, até que formasse no fundo da panela pesada uma casca alta e marrom, para deleite dos últimos da fila.
Que cheiro de Natal! Mas ainda era novembro. É que naquele lugar, ninguém perdia nenhum dia sequer e nem esperava data festiva para se banquetear.


Pintura: Albert Eckhout

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Doces bebês

Para lembrancinha, idéia original. Para degustação, piadinha tola!
São fofíssimos os bebês, mas não são de  açúcar. As fotos circulam pela internet com a pergunta: QUEM TEM CORAGEM DE COMER? Besteira, mas se a moda pegar... Conheça por aqui o trabalho de Camille Allen.

sábado, 6 de novembro de 2010

O último pedido

Um rei encontrava-se debilitado em seu leito de morte. Sem forças ou propósito para pensar na vida, mantinha os olhos fechados por se recusar a ver alguma coisa inédita. O pouco pensamento que valia a pena gastar naquele momento era direcionado ao bem-estar físico e ao desligamento das coisas terrenas, isso ele fazia questão. Ouvir, de nada adiantava, era tudo muito incômodo. Ninguém mais sabia o que fazer. O rei preparava-se com muita dedicação, minuto a minuto, para conhecer o tão falado trono de Deus. Ou o cheiro do enxofre.
Mas faltava-lhe algo e ele sabia. Num fim de tarde pediu que lhe agradassem o paladar, o último dos sentidos que considerava relevante.
Então listaram os pedidos, com os detalhes que pouco a pouco ordenava, nem um grão a mais, nem um grão a menos de sal. Tudo tinha de ser preparado com delicadeza, como cada um dos ingredientes que escolheu.
Às 21:00 hs pontualmente o desfile de degustações estava pronto. A fila de serviçais, cada um com uma bandeja de prata, aguardava no corredor.
O primeiro entregou-lhe uma xícara de duas abas com o caldo morno de uma canja de aves de caça. Em seguida chegou uma fatia de fígado de ganso com pimenta de aroeira. O terceiro serviu-lhe aspargos frescos com um fio de azeite curtido no endro amassado. Logo depois vieram as ostras, acompanhadas ainda de cheiro de mar, sobre um filé de peixe-espada cozido com aipo. O outro trouxe-lhe uma casca inteira de camembert derretida dentro do pão quente. E como não podia deixar de sentir mais uma vez, um pêssego crocante e doce do bosque, embrulhado em sua pele aveludada.
Ficou faltando na sequência a última coisa da lista, que ainda alvoroçados, estavam por resolver: uma taça de cajuína bem refrescante. Mas naquele reino ninguém sabia o que era.


Pintura: Jean-Baptiste Debret

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Tem alguém em casa?

Por onde anda a anfitriã que deixou esta casa abandonada? Ah, se eu dissesse que anda entretida com a preguiça não estaria mentindo. Mas se afirmasse também que anda muito atarefada, isso não seria lorota. Mas entre as espichadas e os deveres, existem as refeições. E isso não pode ser abandonado nem por decreto!
Andei matando umas vontades, com a desculpa de que tenho que realizar uns experimentos no meu escritório – a cozinha.
Outro dia meu paladar pediu algo doce e picante ao mesmo tempo. Nada melhor do que me inspirar nas culturas indiana e tailandesa. Então nem dúvida houve.
Refoguei peito de frango com azeite e três colheres de açúcar para caramelizar. Meio litro de vinho branco seco (olha, se fosse saquê seria mais coerente, mas não deu para me arrepender, não), suco de dois limões espremidos, pimenta-do-reino, pimenta dedo-de-moça, uma cabeça de alho com casca, três colheres de curry e uma pitada de sal. O frango cozinhou no molho amarelo até que este apurasse bem, ficando quase pela metade.
No outro dia estava querendo um azedume suave. Mas na verdade nem mesmo sabia o que queria, foi quando abri a geladeira e o queijo cottage é quem me convenceu. Uma colherada e pronto, é isso. Mandei o queijo pro macarrão, a se entender com o azeite. Ah, sim: o penne foi da Renata. A marca Renata granno duro, que está de bom tamanho.
Até pouco tempo atrás não suportava pepino nem melancia. Melancia continua fora da minha listinha, mas aprendi de que maneira eu gosto de pepino. A primeira é do tipo mediterrâneo simples: com coalhada fresca e limão.
A segunda é do tipo oriental: agridoce.
Você corta o pepino (italiano, aquele fininho) em rodelas finas e deixa que ele se desidrate em uma mãozada cheia de sal. Depois de meia hora ele estará quase nadando em sua própria água. Nessa meia hora você vai preparando a mistura de água, vinagre branco e açúcar na mesma proporção (uma, duas, três, quatro ou etecétera xícaras de cada, a quantidade necessária para cobrir as rodelas dos tantos pepinos que você comprou). Essa mistura deve ser muito bem mexida, até que o açúcar se dissolva. Pois bem, os pepinos salgadinhos, agora, vão levar um banho debaixo de água corrente, no escorredor, para que fiquem sem o excesso de sal. Eles estarão amolecidos e ainda crocantes, portanto, você pode espremê-los de pouco em pouco, com as mãos fechadas, para tirar também o excesso de água.
Olha, parece bem complicado mas não é, só não estamos habituados a fazer esse tipo de tempero. Mas eu garanto que dá certo.
Os pepinos agora já salgadinhos e espremidos, podem mergulhar no preparado agridoce e ali descansar por pelo menos 3 horas na geladeira, até curtirem. Uma ou duas folhinhas de louro caem bem ali também.
Sabores que para muitos pode nem surpreender tanto assim. Mas satisfazem.
Foram boas as desculpa pelo sumiço?

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

O Bar do Zé Varisto

Um bando de jovens senhoras de respeito, desprovidas de maridos e filhos, resolveram que terão uma vez por mês, seu fim de semana de folga. Onde? Rodeadas de um verde legítimo, com direito a conforto, piscina, revoada de pássaros, bagunça da boa e um riacho particular beirando o sítio de propriedade da "jovem-senhora-mor." Ah, já ia me esquecendo: com direito também a um boteco próprio dentro do sítio, lá do lado do casarão, que por acaso fica bem pertinho do pôr do sol. Mas essa é outra história.
O Bar do Zé Varisto tem um balcão de vidro, mas atrás dele não tem um português de lápis na orelha marcando os pedidos na caderneta, não. Também não tem fiado. O Zé Varisto é como se fosse a extensão da cozinha e da sala de estar.
A venda (que nada se vende) é um cenário digno de Viola, Minha Viola, com a impressão de que o Rolando Boldrin e a Inezita Barroso vão chegar a qualquer momento. Só pra não falar do fantasma do Chico Mineiro.
As prateleiras altas, as mesas e cadeiras também de madeira escura, as garrafas de tudo um pouco, canecas empoeiradas, fotos e textos nas paredes registrando a história do lugar, uma geladeira das antiga, outra geladeira da Brahma, o baleiro, os santinhos padroeiros, a caixa registradora, a máquina de assar frango, a vitrola, o telefone pesado e preto, um orelhão que não funciona (por falar nisso, lá celular também não funciona) e todas as bugigangas imagináveis que podem ser úteis para caricaturar e dar vida àquele empório caipira encontram-se lá, de uma parede à outra, do teto ao chão.
O Zé Varisto é super organizado. Tem os sócios-fundadores, eleição pra presidente, primeira-dama, banheiros masculino e feminino, e um viralatinha felpudo branco e preto para dar as boas-vindas os convidados, que os anfitriões fazem questão de recebê-los de braços abertos. E sirva-se quem quiser! Mas é só para convidados.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Segurança dentro e fora de casa

A nutricionista Valéria Brandão trabalha com higiene alimentar. Já viu coisas de arrepiar os cabelos nos estabelecimentos comerciais que trabalham com comida. Coisas que comemos por aí diariamente. Infelizmente, muitos dos bares, lanchonetes, cafés e restaurantes não dispõe de verbas para o trabalho de uma profissional da área da vigilância sanitária. Economia porca. O que os olhos não vêem, o estômago não embrulha? Nem sempre. Abaixo ela deixa dicas importantíssimas para começarmos uma conscientização dentro de casa:

O perigo pode estar no carrinho de cachorro-quente, no restaurante próximo ao trabalho ou até mesmo na geladeira de casa. Todos os alimentos são de riscos se preparados sem higiene e/ou mantidos sem refrigeração ou aquecimento adequados.
Alguns alimentos exigem cuidado dobrado antes de serem colocados no prato, ainda mais quando não se conhece a sua procedência. Confira os alimentos mais relacionados a riscos de contaminação:

Sobras do almoço
Aquele arroz com feijão que sobrou do almoço pode ficar para o jantar e até para o dia seguinte, desde que manipulados de maneira adequada. Tire das panelas, acondicione-os em outro recipiente e leve-os à geladeira, mesmo quentes. Isso não estraga a geladeira, nem a comida. Mas até que esfriem, mantenha o recipiente aberto. Aquelas gotículas de água que se formam na tampa (umidade) podem facilitar a proliferação de bactérias.
A geladeira doméstica geralmente trabalha a dez graus: essa temperatura é capaz de conservar a comida por 24 horas. Se estiver a cinco graus, o prazo se estende até três dias. Agora, se a sobra for grande e não for consumida rapidamente, melhor é congelar.

Frios
Retire-os da embalagem original e coloque-os em recipientes com tampas. Na hora de se servir de uma fatia, utilize um garfo, evitando manipular o alimento com as mãos. Consuma-os em até dois dias. Ranço e gosma na superfície dos frios significam microorganismos em ação – e problemas de contaminação na certa, se forem ingeridos.
Geralmente, pães e salgados, preparados com leite e ovos, que são também recheados com os frios, costumam ficar expostos, enfeitando a mesa numa festa de aniversário durante horas, por exemplo.
Esse tipo de alimento não pode ficar mais de duas horas em temperatura ambiente, sob o risco de favorecer a proliferação de bactérias e toxinas.
Mas o risco maior está na hora de apagar as velinhas. O aniversariante assopra e espalha gotículas de saliva cheias de Staphylococus aureus, que podem produzir toxinas que provocam intoxicações com náuseas e vômitos.

Ovo
Pode abrigar a bactéria Salmonella, que causa diarréia, febre e vômitos, e até óbito em crianças, gestantes e pessoas com o sistema imunológico debilitado. O maior risco é ingeri-lo mal cozido (com a gema mole) ou cru (usado em alguns preparos como a maionese).
Segundo o biomédico Roberto Figueiredo, o Dr. Bactéria, um em cada 200 ovos em uma granja pode conter a Salmonella. A dica é optar pelo produto pasteurizado. O processo de pasteurização elimina a bactéria. Acontece que na rua nem sempre é possível confiar na procedência do alimento. Se o ovo estiver contaminado, a alta temperatura do cozimento será capaz de eliminar o microorganismo.

Folhas
Larvas e bactérias podem estar escondidas entre as folhas verdinhas. Só lavar com água não basta. É preciso realizar uma desinfecção química para eliminar os microorganismos. Isso significa que antes de consumidas, as verduras devem ficar mergulhadas por pelo menos 15 minutos em uma mistura de água e água sanitária (hipoclorito de sódio). Para cada litro de água, uma colher de sopa de água sanitária de boa procedência e não odorizada.
Não é o caso de eliminar a salada do prato, de maneira nenhuma. Mas fique atento à higiene do local e às condições de preparo e armazenamento dos alimentos.

Carnes
Espetinhos, churrasquinhos, sanduíches de carne assada podem conter a bactéria Clostridium perfringens, causadora de cólicas e diarréia. Esse microorganismo é resistente muitas vezes até ao cozimento. A carne deve ser armazenada sempre em temperatura inferior a cinco graus. Na hora de consumir, opte pela que foi preparada na hora e bem passada, sendo mantida acima de 60 graus.
A salsicha pode conter a bactéria Listeria monocytogenes. Após sua ingestão, costumam aparecer diarréia e fortes cólicas abdominais, por 24 horas. Não é indicado consumir a salsicha que esteja fora de refrigeração, crua ou aquela mergulhada há horas na cuba do carrinho de cachorro-quente, a não ser que a água emane vapores, isto é, esteja acima de 60 graus.
Ela deve ser cozida na hora e por cinco minutos após levantar fervura. Cuidado com o purê que acompanha o sanduíche, por ser preparado com leite e muitas vezes ficar exposto inadequadamente – o que também pode causar problemas.

Maionese
Para passar a idéia de saborosa e sem aditivos químicos, muitos comerciantes oferecem a “maionese caseira”. Além do risco da contaminação pelo uso de ovos crus no preparo, a falta de higiene da embalagem (bisnagas) e a refrigeração inadequada transformam o alimento em uma bomba de contaminação.
Nunca coma maionese feita com ovos crus ou em embalagens que ficam fora da geladeira. Nesse caso, prefira os sachês industrializados, bem como a mostarda e o catchup.
Nem a segurança do lar está imune aos microorganismos. Aliás, pesquisas apontam que a maior parte dos casos de contaminação acontece dentro de casa.

Palmito
Ao comprar o produto, verifique as informações da embalagem: o rótulo deve conter a data de validade, o número do lote e os dados do fabricante. Um alimento de má procedência pode conter a toxina botulínica, bactéria transmissora do botulismo, doença que pode levar à morte.
Palmito em conserva só deve ser adquirido de marca e estabelecimentos confiáveis. Por ser um vegetal mole, ele não resiste a altas temperaturas, e para que não venha desenvolver a toxina botulínica, deve ser preparado industrialmente com quantidades de ácido e sal adequadas. As conservas clandestinas, caseiras ou adquiridas em beira de estrada são de extremo risco. E antes de consumi-lo, a recomendação é fervê-lo durante 10 minutos.

Enlatados
O cuidado aqui é com a embalagem. As latas têm um verniz interno, que preserva seu conteúdo. Pequenas batidas podem romper essa proteção e comprometer o alimento. É importante também higienizá-las (lavar com água e detergente) antes de abri-las.
Ao abrir, verifique se não contém bolhas, como se estivesse fermentado. Drene a água e consuma ou prepare imediatamente. Se não for utilizar todo conteúdo da lata, retire da embalagem, coloque em outro recipiente com tampa, marque a data e consuma em até três dias.

Para entrar em contato:
Valéria Urbini Brandão - CRN 4727
(11) 9627.8927

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Homem vs. Insanidade

Nunca vi nada mais sem nexo do que o programa Man v. Food, apresentado no canal Fox Life. Um homem se propõe a comer uns dois ou três kilos de comida dentro de um determinado tempo e no final, depois de estufado e suado, grita vitorioso com os braços pra cima:
- Mais uma vez o homem venceu a comida!
E uma platéia o aplaude.
Pronto. Assim é o programa. O que é obvio, é que a comida não está fazendo absolutamente nada contra esse homem, só ele com ele mesmo está. Como se desse umas cabeçadas na parede, não com mais força do que suporta, e ao sobreviver comemorasse sua vitória: mais uma vez o homem venceu a parede!
Ele conhece seus limites, então que tipo de desafio é esse? Aposto que nem encararia comer o dobro da comida estabelecida ou mesmo um único prato feito com fugu, o peixe venenoso, inteirinho, acompanhado de molho concentrado de pimenta mexicana da mais picante. Por que é que ele não toma caipirinha de peyote com uma bacia de feijoada? Não seria um bom começo para desafiar a comida, se é que existe esse termo?
E qual é mesmo o mérito de conseguir comer até não agüentar mais?
Algum destino relevante e surpreendente para esse infeliz que eu não esteja vislumbrando?

domingo, 12 de setembro de 2010

A ajudante que não queria ser vista

Aconteceu num evento. A chef confeiteira providenciou um uniforme para sua ajudante, Mariquinha. Como foi de última hora, não havia tempo ou frescura para experimentar a peça. Frescura, aliás, era luxo que Mariquinha não tinha direito algum, afinal de contas, quem iria se incomodar? Mirradinha, pele manchada, olhos e cabeça grandes demais, pernas feito vara de bambu, assim se resumia a moça tímida e sorridente.
O uniforme era bonito, como manda o figurino, mas ficara largo demais e sobrava pano para todo lado.
Desconcertada, ao vestir a roupa antes da festa, a ajudante soltou baixinho alguma reclamação.
- E quem é que vai reparar? Perguntou sua chef , na pressa afobada dos preparativos.
Fim de papo. Só lhe restava um evento inteiro pela frente. A missão torturante de servir e passar despercebida. Tortura essa que era dela mesma e de mais ninguém. Nem de convidado algum e nem de sua superior.
Mariquinha sofreu, dentro de seu pequeno universo, trabalhando naquela noite com a cabeça mais baixa do que o normal, com os ombros mais curvados e com o pescoço mais afundado em seu uniforme de tamanho G, pelo único pecado de possuir um pouquinho de vaidade. Mas cumpriu seu dever com tristeza e delicadeza - essa, de praxe - e voltou para casa pensando que talvez tivesse que ter mais humildade da próxima vez e aceitar a vida como é. Só não sabia que sofrera em vão, pois, de fato, ninguém havia reparado nela.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Vai um docinho aí?

Essa semana entrei numa padaria e pedi, diante do maravilhoso balcão de confeitaria, uma caixinha com um mix de pelo menos cinco docinhos, cuidadosamente trabalhados e apetitosos.
Era fim de tarde e a atendente, que fazia o tipo bem acima do peso, com cara de cansada pela correria que exige o trabalho, fez a pergunta clássica enquanto pesava a embalagem:
- Deseja mais alguma coisa?
- Isso é suficiente pra deixar alguém feliz? Perguntei
Pronto. O sorriso revelador de quem aprovaria o presente respondeu antes mesmo de suas palavras entusiasmadas:
- Nossa, eu ia amar se ganhasse uma dessas!
Sou uma pessoa que liga pouco para doces, mas quando o organismo pede açúcar, sai de baixo. Não vou levantar aqui as questões sobre malefícios ou benefícios deste produto que há séculos atrás, quando chegou à Europa, além de substituir o mel, era usado também como tempero raro e nobre para incrementar os pratos salgados. A trajetória do açúcar foi longa até fazer parte do nosso dia-a-dia.
Ganhar doces pode causar tanta euforia como ganhar flores. As flores murcham e os doces são consumidos rapidamente, portanto são presentes que duram pouco. Mas isso pouco importa. Até quem não pode ingerir açúcar procura desesperadamente pelos diets.
Não vivemos sem os doces, por isso me pergunto: açúcar é mesmo fundamental para o organismo ou nos viciamos de alguma maneira? Se for fundamental, não sobreviveríamos apenas com os açúcares naturais de outros alimentos, como as frutas e alguns legumes, por exemplo? Afinal de contas ele não existe na história da humanidade desde sempre. E se eu me alimento dessas frutas e legumes, por que é que ainda sinto necessidade de mais?
Perguntas que o Google responde, mas creio ser um hábito e uma cultura irreversíveis para nós, se até com nossas emoções o açúcar mexe profundamente.



quarta-feira, 1 de setembro de 2010

ABCDiário

As palavras devem ser leves como a comida, essas que pesam mais ou menos de acordo com o significado e a entonação. Tanto as palavras como a comida, se equivocadas, trazem doenças. Lembrando que antes de abrir a boca para proferir ou engolir, algum pensamento vem, bem lá do fundo da alma. Ou tranqüilo para cortar ou afiado para ferir - viver neste mundo é loucura.

terça-feira, 31 de agosto de 2010

Alimentação infantil é coisa pra lá de séria

Já que falei de crianças nos posts anteriores, quero aproveitar a carona e publicar o texto do último boletim da nutricionista Ana Ceregatti, alertando para os problemas da alimentação  infantil. Não é incomum presenciarmos, seja lá onde for, crianças com pacotinhos de bolachas e salgadinhos nas mãos, o que parece ser uma maneira fácil e prática, porém perigosa, de agradá-las ou alimentá-las.
Vale a pena também conferir o site da profissional, que possui consultório em São Paulo e atenderá em breve em Campinas: http://www.anaceregatti.com.br.

"MAMÃE, COMPRA BRÓCOLIS?"
Sonho de consumo de muitas mães, essa frase ficou famosa por ter sido dita de maneira bem divertida em um comercial de TV. Mas, na vida real, alguém já viu uma criança fazer escândalo para conseguir um ramo de brócolis? Ou uma negociação constante entre mães e filhos nos corredores dos supermercados é uma visão mais comum – para não falar daqueles escândalos típicos da criançada, que nos deixam sem saber o que fazer?
O que de fato acontece para as crianças rejeitarem tanto os verdinhos e adorarem os “porcaritos”? Há dois aspectos a considerar: o que é da natureza humana e o que se aprende no mundo.
Para começar, vale dizer que o sabor doce vem de fábrica, ou seja, nós nascemos com esse sabor identificado. É instintivo. Os demais, como o azedo, o salgado e o amargo, serão desenvolvidos conforme a criança for experimentando os alimentos.
Mas esse processo não acontece somente quando os pequenos começam a comer papinhas, perto dos 6 meses. Ele tem início nas primeiras horas de vida, através da amamentação, quando o bebê entra em contato com diferentes sabores e aromas presentes no leite materno, formados a partir da alimentação da mãe.
Outra ajudinha que a natureza dá de presente é a variação natural de sabor que o leite humano tem com o passar dos meses. À medida que a criança vai crescendo, a quantidade de lactose (açúcar do leite) vai diminuindo e o teor de cloretos vai aumentando, tornando o leite levemente salgado, preparando o paladar do bebê para o que vem pela frente.
Infelizmente, quando a criança é alimentada com fórmulas infantis – que têm sempre o mesmo sabor – esse aprendizado não acontece da mesma forma. Nesse caso, a única opção é trabalhar o processo de aprendizagem através de exemplos e de rotinas, com uma grande pitada de bom humor, paciência e perseverança. Só assim poderemos garantir que o brócolis não perca para sempre seu lugar para a batata frita!
Mas não importa se o pequeno mamou ou não no peito: ele vai aprender a gostar dos alimentos que lhe são oferecidos com mais freqüência e passará a preferi-los da maneira como lhe foram apresentados na primeira vez. Por isso, se desde o início a criança for acostumada a comer alimentos contendo muito sal, açúcar e/ou de gordura, ela carregará essa preferência para a vida adulta e tenderá a rejeitar alimentos mais saudáveis, que naturalmente contêm menos sal, açúcar e gordura. A variedade de cores, sabores e textura ganha então especial destaque.
Outra coisa importante: as caretas que a criança faz quando experimenta algo pela primeira vez, especialmente quando são bem novinhas, não significam que ela não gostou do que provou. Um único contato não é suficiente para desenvolver a rejeição pelo alimento.
Para os mais crescidinhos, que insistem em não comer (para o desespero das mães!), vale dizer que as atitudes e comportamentos do responsável pela alimentação da criança têm grande influência sobre seus futuros hábitos.
Chantagens, coações ou subornos podem até aumentar a rejeição pelo alimento. Pior ainda são as moedas de troca. Frases do tipo “se comer tudinho, vai ganhar uma balinha” são ótimas para atrapalhar de vez a construção de bons hábitos alimentares. Nesse caso, o mais grave é que esses alimentos são considerados pobres e inadequados do ponto de vista nutricional, por conterem excesso de calorias, açúcar, gordura e sal, grandes vilões na saúde de jovens e de adultos.
Os responsáveis pela alimentação também precisam dar o exemplo. Dificilmente uma mãe fará o filho comer brócolis – ou qualquer coisa do gênero – se ela não tem o hábito de consumir esse tipo de alimento. A criança pode pensar (e com razão): por que eu tenho que comer isso se nem minha mãe come?
E o oposto também é verdadeiro: não adianta proibir a criança de comer “tranqueritos”, como refrigerantes, salgadinhos, doces, lanches, chocolates, bolachas, balas e afins, se os pais ou responsáveis fazem disso a base da sua alimentação!
Então, como proceder para um dia ouvir seu filho pedir brócolis e ficar hiper feliz se em troca você der um rabanete?
Além das dicas acima, vale rever os hábitos alimentares da família, buscando por produtos mais naturais e vivos, como as frutas, verduras, legumes, cereais e feijões. Como muita gente vive na cidade grande, sem acesso a alimentos colhidos na hora, tendo como única opção os supermercados e feiras, o ideal é comprar alimentos minimamente processados – porque industrializados o arroz, o feijão e o sal também são!
Evite alimentos prontos, que só precisam de 5 minutinhos no microondas, ou que contenham um caminhão de aditivos alimentares. Leia rótulos: se não conseguir entender ou repetir o que está na embalagem, não compre!
Evite também alimentos que contenham gordura vegetal hidrogenada ou margarina, sinônimos de gordura trans, como pratos prontos, bolachas (até aquelas de água e sal, que muita gente come quando está de regime, tem trans), bolos, pipocas para microondas, sopas de pacote, salgadinhos, enfim, tem tanta coisa que é feita com gordura hidrogenada que ficaria muito longo citar tudo. Busque esse componente na lista de ingredientes, mesmo se na embalagem estiver escrito 0% de trans.
Ensine a criança a comer frutas, verduras e legumes, sem escondê-los no meio de outros alimentos.
Monte uma lancheira saudável: bolos caseiros, pãezinhos (sem gordura trans) com geléia ou pastinhas ou bolachinhas integrais, acompanhado de frutas frescas ou secas (ameixa, uva passa, bananinha) e mais um suco, preferencialmente natural ou de caixinha que não tenha corantes e açúcar.
O mercado dispõe cada vez mais de opções integrais e orgânicas, com o mínimo necessário de aditivos alimentares e sem trans. Vale investir um tempo para pesquisar as gôndolas dos supermercados.
Uma criança saudável, bem nutrida, feliz e com peso adequado será um adulto mais em paz com suas emoções e com o seu corpo!

domingo, 29 de agosto de 2010

Comidas divertidas

Meu amigo Carlos foi convidado para uma pizzada, e chegando no local, para sua surpresa, o sabor da pizza era único: pizza de cachorro quente.
Minha mãe, isso que eu chamo de cozinha fusion. Do tipo strogonoff de lasanha. Ou fricassée de yakissoba.
Quando pequena, adorava levar na lancheira da escola sanduíche de manteiga com açúcar. Há mais mistérios entre o paladar infantil e o adulto do que sonha a nossa vã filosofia.
Gostava também de encontrar nas festinhas de aniversário – naquela época não havia os buffets infantis – mini pão francês com carne louca. Nada a ver com a doença da vaca. Era um nome divertido, mas tinha vergonha de comer porque na primeira mordida a carne toda escapava por baixo. Então me contentava em observar o malabarismo dos outros.
Divertido é comer pé-de-moleque quando se usa aparelho nos dentes. Fazer força em câmera lenta.
Divertido pode ser tomar caldo de kava-kava nas Ilhas Fiji, como mostrou um programa de TV, ou tacacá no Pará, ambos com ingredientes que amortecem a língua, principalmente se estivermos em clima turístico, bem alegrinhos.
Ou ainda pode ser divertido cozinhar com os amigos, mesmo que a comida não saia assim, com um resultado tão emocionante.

sábado, 28 de agosto de 2010

Os mundos que não conhecemos

O ousado projeto EAT THE WORLD foi idealizado por Kiko e Maria. Era o sonho de ambos e tornou-se realidade. Ele é chef de cozinha e ela jornalista. O casal de portugueses dará a volta ao mundo, conhecendo a mesa e a cultura gastronômica de diversos países. O Kiko é sobrinho do meu querido amigo Ronnie e no final do ano eles estarão pintando aqui no Brasil. Acompanhe as aventuras pelo site.

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

O universo das crianças


Tem uma outra história (essa verdadeira, diga-se de passagem) de uma menina que pedia insistentemente à tia que tirasse os sapatos, porque ela queria ver os seus pés. Curiosa, obviamente, a tia quis saber o motivo.
- É que minha mãe disse que a senhora tem pé de galinha...

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Vamos de abobrinha!

Adoro ingredientes generosos, desses que, além de mostrarem o sabor, dão um espaçozinho para o ingrediente que o acompanha. Um exemplo disso é o queijo coalho. Uma vez fiz uma salada de salmão defumado com o queijo em pedacinhos. O sabor do queijo puxou uma poltrona ao seu lado para o salmão se sentar e estes viveram felizes para sempre em minha memória.
É o contrário do pimentão e do coentro, que se usados de maneira errada, simplesmente atropelam e lideram todo o resto que estiver ao redor.
Hoje o prato é com abobrinha – minha predileta – que também se revela muito generosa.
A receita é fácil e o resultado... bem, fica por conta de cada um.
São praticamente quatro ingredientes usados: abobrinha em lâminas ou rodelas de 0,5 cm, molho de tomate suave, shitake limpo (sem os cabinhos) e queijo parmesão ralado.
Quando não tenho tempo para fazer um molho, gosto de usar tomate pelati (minhas marcas prediletas são La Pastina, Casino, De Cecco ou Raiola. O Fugini é um tanto quanto ácido).
Muito bem: tempere o molho e a abobrinha com sal, e se desejar, com um fio de azeite também antes de misturá-los. Monte num refratário alto, intercalando como uma lasanha, um pouco de molho, as lâminas de abobrinha, as rodelas de shitake e queijo parmesão ralado para cobrir.
Forno baixíssimo até que o molho ferva e o queijo gratine de leve, dentro de 40 a 50 minutos mais ou menos. O shitake é bem consistente e abobrinha ficará al dente - aviso com antecedência, por que se você não gostar é melhor que cozinhe os dois um pouco antes.
Dá para colocar tudo numa panela e levar ao fogo? Sim, isso também é possível, com um outro resultado também muito agradável. Invente seu jeito de fazer. E faça as experiências. O importante é que sua cabeça se ocupe desta tarefa imensamente terapêutica, a de cozinhar.

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

De onde vêm os costumes?

Colocar vinagre em carne de porco para temperá-la não surgiu do nada. Creio eu que isso tenha a ver com os tempos em que não existia refrigeração. O vinagre era usado nas carnes para espantar mosquitos, e o sal e a defumação, para conservá-las. Quando as caixas que continham barras de gelo antecederam as primeiras geladeiras, não havia mais preocupação com os insetos e nem com a conservação.
Mas é possível que o vinagre tenha apenas mudado de papel no caso da carne suína, já que o condimento combina um tanto com ela, o que não é o caso dos demais tipos de carne. É só uma hipótese.

O risoto que conhecíamos antes de encontrarmos o Arbóreo por aqui, era feito do nosso arroz branco (que nem sempre foi nosso), depois misturado com ovo, queijo, cheiro verde e finalizado no forno. Ora, por acaso os imigrantes italianos encontravam o arroz Arbóreo, o Carnaroli ou o Vialone Nano no Brasil do final do século XIX? Depois de gerações, uma cultura se formou. Quando o arroz italiano começou a ser apresentado no começo dos anos 80 por alguns dos restaurantes típicos, o risoto amador brasileiro estava prestes a completar 100 anos.

E acho que algo semelhante aconteceu com a nomenclatura de uma verdura no sul do país, provavelmente também após a imigração. Lá, almeirão é chamado de radicci. E havia alguma verdura que se assemelhasse mais, não pela cor, mas pelo sabor, ao radicchio italiano?
Longe de mim ser uma pesquisadora, já que isso seria a última das opções em minha listinha de ambições. São apenas hipóteses.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

O lanchinho do intervalo

Ouvi na internet os conselhos de uma nutricionista alertando sobre os cuidados que devemos ter com o lanchinho que fazemos entre uma refeição e outra. De cara o leitor deve imaginar que ela pede para trocar a coxinha, a esfiha e o pão de queijo por uma torrada com queijo branco, patê de atum ou peito de peru e suco de frutas no lugar do refrigerante. Acertou.
De um tempo pra cá tenho evitado mesmo as coxinhas e outras massas fritas, mas quando a reuniãozinha de fim de tarde com os amigos acontece no Bar da Coxinha, fica difícil evitar. Não que não exista a possibilidade de uma salada de palmito com rúcula, que consta sim do cardápio, mas aí a graça se perde.
Meu último intervalo foi um sanduíche feito do almoço. Havia refogado fatias de lombo de porco, marinadas em vinagre e alho – grande segredo da cozinha mineira para a carne suína – e finalizado com bacon e tomate sem pele, bem picadinhos. Após sair do fogo, o prato também levou muita salsa salpicadinha.
Acontece que umas horas depois na geladeira, o tempero dos filés curtiu barbáries na carne. Estava digno de um lanche de boteco chique, típico paulistano, desses em que os garçons usam gravata borboleta e toda a decoração é milimetricamente planejada para dar um ar de anos 40.
Eu sempre acho que o sabor de fundo de bacon tostado lembra uma tórrida paixão de inverno, cujo frio passa imperceptível - claro que dentro de um roteiro de filme classe C. Se fosse classe A, nem cheiro de comida teria, apenas o gosto de um vinho tinto bem raro.
E no fim da conversa, a dica mais importante da nutricionista e, do meu ponto de vista, a mais relevante: Não passe fome!

sábado, 7 de agosto de 2010

Mole Poblano

Juro mesmo, tô procurando que nem louca a receita da Pilar pra postar aqui!

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Arroz com Clight e o TNT

Um hábito se torna a segunda natureza, alguém já falou isso. Apertamos o play desde o primeiro minuto do dia e assim vamos sendo conduzidos pelo piloto automático sem darmos conta dos nossos movimentos, desde os mais banais até os importantes. O pensamento anda sempre distante e é só nele que focamos a maior parte do tempo.
Uma senhora me disse que, distraidamente, colocou um envelopinho de suco Clight Lima-limão no arroz e nem se deu conta, achando que fosse o tempero industrializado Meu Arroz, da Knorr. Foi a diversão do dia para o marido, que ligou para os parentes contando.
Certamente, se ela tivesse que picar cebola e alho, não os confundiria com um envelope esverdeado.
Mas os temperos químicos já são um hábito na cozinha da maioria das pessoas, assim como os sabores artificiais fazem parte do padrão das papilas gustativas das mesmas.
Há alguns textos abaixo, fiz uma comparação entre Alex Atala vendendo caldo Knorr e Machado de Assis divulgando livros do Paulo Coelho, mas hoje ocorreu-me uma situação absurdamente semelhante: a de Coco Chanel confeccionando chapéus de TNT (tecido-não-tecido).
E daí surgiu a melhor definição para os alimentos industrializados, tantos que são: CNC (comida-não-comida). Nada mais coerente. Se tudo no mundo é imitação, por quê não enfiar goela abaixo, de forma bem literal, mais essa?

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

O dia em que apimentei a boca de Salvatore Loi

Foi há uns bons pares de anos, quando estagiei na maravilhosa cozinha do Fasano. Depois de uma semana de intimidade (formal, diga-se de passagem), os simpaticíssimos sub-chefs Rodrigo e Sandro incentivaram-me a fazer a amostra de uma receitinha que acabara de compartilhar. Era carpaccio de pêra ao forno com açúcar mascavo e pimenta-do-reino, acompanhado de um queijo cremoso.
Acontece que estagiários e marinheiros de primeira viagem pagam mico onde quer que se encontrem.
O moinho de pimenta é praticamente uma ferramenta pessoal, em que você coloca os tipos de pimenta que quiser (brancas, pretas, rosas, com ou sem sal grosso) e na proporção que desejar.
Estava acostumada ao meu, com metade de pimenta branca, que é mais fraca e a outra metade da preta. Mas o moedor de pimenta do Loi estava com cem por cento da preta. E eu nem me toquei. Sabendo de cabeça a quantidade que iria nas lâminas de pêra, tasquei o tempero sem hesitar.
Na hora da degustação, um prato decorado e apetitoso para cada um, do jeito que manda o figurino.
Salvatore Loi, como um lorde europeu que é, conseguiu engolir a tosse juntamente com a delicada garfada que havia dado, e com toda a seriedade que lhe pertence, limitou-se a comentar que “si, si, está um poco carregado.”
Já o Rodrigo e o Sandro tossiam no outro canto da cozinha, mas de tanto que riam. Pelo menos esses gentis meninos ajudaram-me a desfazer o imbroglio formado em meu estômago pelo constrangimento que passei. O humor nacional é de fato um ingrediente fundamental!

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Alimentação para cães e gatos

Para quem acha que seu cão, como nos desenhos animados, deve se alimentar diariamente de um bifão, e seu gato, de um delicioso peixe para lamber até as espinhas, não pode deixar de ler de cabo a rabo o site Cachorro Verde. E bom apetite para os bichanos!

domingo, 25 de julho de 2010

Estômago blindado, paladar de ferro

O que é que baianos, mexicanos e tailandeses têm em comum? Paixão por uma boa pimenta. Paixão que surgiu com o hábito? Porque para o povo dessas culturas, se comida não leva pimenta é rotulada de sem graça.
O Portal Terra publicou uma reportagem interessante sobre a pimenta mais forte do mundo, a buht jolokia, e uma escala de ardência entre as mais conhecidas. No filminho mostrado pelo site, a autora da matéria  experimentou a pimenta indiana e passou mal diante das câmeras.
Quem nunca ousou carregar a comida com uma pimenta forte, poderá estranhar a reação da repórter, mas a brincadeira é de arrancar lágrimas. Assim como marinheiros de primeira viagem em restaurantes japoneses que colocam de uma vez só um tantão de raiz-forte na boca, achando que se trata de purê de abacate.
Uma vez ministrei um curso de comida tailandesa, cujas receitas eram carregadas de curry daquele país. O curry tailandês, ao contrário do indiano que conhecemos por aqui, não é um pó amarelado e inofensivo. É uma pasta muito bem condimentada, feita de pimentas verdes, amarelas ou vermelhas. E das brabas.
Ao testar os pratos escolhidos, tive que diminuir das receitas originais 2/3 do curry para adaptá-los ao nosso paladar. E mesmo assim a experiência foi bem picante para muitos dos alunos.
Numa outra aula, a amiga mexicana Pilar veio nos ensinar a fazer Mole Poblano, o prato típico de Puebla - peru (ou frango) com chocolate. Quando a febre de chocolate com pimenta se instalou no Brasil por conta da novela, via nos programas de TV, culinaristas misturando chocolate ao leite com dedo-de-moça. Aquilo era café com leite. Além de ingredientes como nozes, amêndoas, amendoim, gergelim, canela, cravo em pó e outros, havia pelo menos três tipos das arretadas.
Pilar pediu que eu comprasse todos os tipos de pimenta que encontrasse nos supermercados e feiras, para que ela pudesse escolher as que melhor se adaptariam à receita original. E um pouco antes da aula ela de fato escolheu as variedades... comendo uma a uma, do mesmo jeito que a gente mastiga com prazer uma ponta de cenoura crua. Do mesmo jeito que fez a repórter, só que com a diferença de que a Pilar tem paladar adestrado para isso.
A Susana, uma baiana da gema, contou-me que quando as crianças deixam os peitos e as papinhas, começam a compartilhar os sabores pungentes com os adultos.
Podemos afirmar então, categoricamente, que se não for através do berço, a intimidade com uma boa pimenta se torna impraticável.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Leminski na cozinha


   lá fora e no alto
o céu fazia
   todas as estrelas que podia

   na cozinha
debaixo da lâmpada
   minha mãe escolhia
feijão e arroz
   andrômeda para cá
altair para lá
   sirius para cá
estrela dalva para lá

segunda-feira, 19 de julho de 2010

O bolso acima da estética e da ética

Quando Alex Atala, o chef mais famoso do Brasil, aparece fazendo propaganda do caldo de galinha Knorr, ocorre no Universo um estrago de igual proporção, caso fosse um Machado de Assis vendendo livros do Paulo Coelho.
Tive o prazer de trabalhar com o Atala num evento da Varig, no extinto Ristorante Cirò, no interior de São Paulo, há alguns anos, assim como já estagiei na cozinha de seu restaurante D.O.M. Ele de fato é uma das pessoas mais simpáticas do meio da esnobe gastronomia. Mas nem por isso meu texto será menos cruel.
Logo ele, que tanto preza a filosofia de Savarin e Carême, vem prometer num discurso remunerado, evolução e revolução em cima de um tempero industrializado?
Péssimos aditivos alimentares, como o GLUTAMATO MONOSSÓDICO e INOSINATO DISSÓDICO, que fazem parte da listinha negra dos médicos por causarem danos à saúde – infantil principalmente – estão incluídos nos tabletes, nos pozinhos mágicos e agora nas gelatinas em forma de caldo.
Talvez a preocupação com a saúde não seja o forte da gastronomia, considerando o uso frequente (e menos excessivo de uns tempos pra cá) de manteiga e creme de leite por exemplo, mesmo porque não é ela que dita a comida do dia-a-dia do brasileiro.
Mas qualquer um que esteja minimamente envolvido com essa área sabe que o pecado número um cometido por um chef, repreendido por eles mesmos, seria mascarar sua arte com um tempero fabricado e artificial.
E verdadeiras antas são os fabricantes desses produtos. OPS! Perdoe-me o leitor por um momento de desequilíbrio emocional. Corrijo: verdadeiras antas são os consumidores desses produtos, incluindo meus amigos e familiares. Verdadeiras antas os que fazem uso de artifícios industrializados na comida. O que garanto não ser o caso de Alex Atala.

sexta-feira, 16 de julho de 2010

O banquete eterno

Ela buscava o sabor por detrás dos remédios que são jogados nos pés das frutas ou nas almas das verduras e legumes. Então, sabia que a maçã colhida hoje num pomar caseiro tem o mesmo gosto de uma maçã colhida num pomar de dez séculos atrás.
Ao passear nas livrarias, não entendia por que as pessoas buscavam os livros de receitas das mais antigas – o jantar do Imperador, o banquete da Rainha – se os produtos encontrados hoje nos mercados prometem infidelidade no resultado final. Que o segredo não era encontrar a receita perfeita, mas ingredientes imaculados. Era possível sim, era possível na cidade grande, ter acesso a ingredientes imaculados para um jantar perfeito, embora desse um pouco mais de trabalho.
Mas não se importava com a pompa do jantar perfeito que tanto fascinava a todos. Tanto fazia a toalha e os guardanapos de linho, tanto fazia ter as taças de cristal. Não perdia tempo, enquanto o resto sonhava com a noite perfecta. Precisava de tanto elitismo para dar prazer ao paladar?
De quando em quando, deparava-se com os sabores mais que perfeitos e também eternos se encontrasse a coisa certa: uma castanha portuguesa mergulhada em mel de laranjeira, um naco de galinha caipira assada com manteiga de sálvia, uma arvorezinha de brócolis com azeite puro e sal, uma cenoura doce assada com vinho branco, a explosão da romã na boca ou a simples acidez do tamarindo forçando os olhos a se fecharem.
E nem a pressa ou qualquer preocupação lhe roubavam um momento desses de prazer. Ela não esperava um acontecimento secular, nem ficava sonhando com algo inacessível. Bastava escolher a dedo o que tinha de melhor. Dava um pouco de trabalho sim, mas o sonho do banquete inesquecível de outros se concretizava um pouquinho a cada dia.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Tudo em nome da tradição


Será que se São Firmino fosse vivo, proporia nas ruas de Pamplona, na Espanha, entre disparos de morteiros e chupinazos, um festival invertido e regado a vinho, em que o povo seria conduzido até a arena por uma centena de manada de touros zombeteiros e loucos?

terça-feira, 6 de julho de 2010

Amares

Nos amávamos rodando pelo espaço e éramos uma bolinha de carne saborosa e suculenta, uma única bolinha quente que resplandecia e jorrava aromas e vapores enquanto dava voltas e voltas pelo sonho de Helena e pelo espaço infinito e rodando caía, suavemente caía, até parar no fundo de uma grande salada. E lá ficava, aquela bolinha que éramos ela e eu; e lá no fundo da salada víamos o céu. Surgíamos a duras penas através da folhagem cerrada das alfaces, dos ramos do aipo e do bosque de salsa, e conseguíamos ver algumas estrelas que andavam navegando no mais distante da noite.

EDUARDO GALEANO - O LIVRO DOS ABRAÇOS

terça-feira, 29 de junho de 2010

É chegada a hora

A Anvisa - Agência Nacional de Vigilância Sanitária - baixou uma resolução que estipula regras rígidas para propaganda de alimentos que contenham excesso de açúcar e gordura. A Abia - Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação - por sua vez, informou que irá contestar na Justiça a medida tomada.
Sem entrar na questão da Abia, que neste blog dispensa comentários, eu gostaria de saber quando é que a Anvisa vai proibir de vez a fabricação de alimentos que não nem chegam nem perto de ser comida de verdade.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Mandioca é doce?

Moro num bairro rural, cercada de chácaras e sítios, com direito a visitas de cavalos e bois que passeiam pelas ruas de terra em busca de capim fresco, de preferência limpos e com gotas de orvalho ou chuva – presumo. Nada diferente do que vivemos fazendo, sempre em busca de algo melhor para matar a fome de todas as horas, mesmo que esse melhor seja um pacotão de bolachas wafer de morango.
Acontece que cada vez mais me surpreendo do quanto estamos distanciados do que é natural, da terra, do jeito que Deus criou.
O Rodrigo, que há um tempo trabalhou como jardineiro aqui em casa, conseguiu permissão com o proprietário de um terreno desocupado para plantar legumes e verduras. Montou sua barraquinha de toldo azul e quase toda tarde e finais de semana vende o que colheu no dia: gigantescas espigas de milho verde, alface, couve-flor, couve manteiga, cheiro verde, espinafre. O brócolis, por exemplo, vem com longas folhas, o que eu adoro e não entendo por que a maioria das pessoas descarta essa delícia. A rúcula é mais forte de sabor, mais encorpada e mais crocante do que a encontrada nos supermercados. O repolho tem folhas tão compridas que enrolam nas pontas, como um papiro. Os rabanetes, ainda bem vivos, vêm cheios de terra, recém-saídos de suas covas úmidas, assim como a mandioca, que me apresentou um sabor que eu não conhecia – o de mandioca!
Comprei meia bacia dos robustos pedaços por R$ 1,00 – isso mesmo – e depois de limpos, tasquei-os na panela de pressão. Meia hora depois, os nacos amarelos e macios estavam fritando no tacho, a todo vapor.
Na hora de experimentar, uma surpresa além da crocância sequinha e indescritível que a mandioca frita pode ter: um leve adocicado – sutil, como o damasco – me surpreendeu de fato. Uai, e por acaso mandioca é doce? Aquela estava, bem no fundo, mas estava mesmo.
Acostumada a consumir mandioca de supermercado, e até de feiras, certamente cultivadas com algum tipo de química, não sabia que poderia conhecer uma outra mandioca.
A barraca do Rodrigo é orgânica? Acho injusto chamá-la assim e também muito sofisticado, considerando que os alimentos orgânicos são mirrados e distantes do poder aquisitivo de muita gente. Prefiro chamá-la de barraca dos alimentos naturais, da terra, do jeito que Deus criou.
Agora um artesão local de queijos colocou seus produtos na banca do Rodrigo e aos poucos sua pequena feira vai se incrementando.
Onde: na esquina da estradinha que leva ao Vale das Garças com a entrada do bairro Village, em Barão Geraldo (Campinas).

sexta-feira, 18 de junho de 2010

O melhor do pior

Uma vez uma pessoa disse para outra: “pegue o seu pior e faça dele o melhor.” Surgiu então, da mente dessa segunda pessoa, uma peça de teatro muito bonita, dessas que falam de sofrimentos de amor - uma história real.
Tive uma semana ruim, com uma gripe batendo na porta e, mesmo não tendo eu aberto nem uma fresta sequer, numa noite destas a dita se espichou em minha cama. Mas não me entreguei. Ela insiste em me seguir como uma sombra, me acompanhando até nos momentos de maior intimidade, mas graças a uma boa alimentação a base de sucos reforçados, legumes, carnes e verduras, meu corpo continua só meu! Bem, menos o nariz. E a garganta nós estamos dividindo.
Do pior da semana, o máximo que consegui foi escrever este texto pobre, pois confesso que a gripe também me causa um pouco de sonolência, o que não é de todo ruim. Mas já dei um ultimato na peste e tenho certeza de que logo ela desiste de me atormentar. Estaria mais brava se não estivesse sentindo o gosto das coisas, isso sim me deixaria possessa! Menos mal.
Agora, se me permitem, vou atender a um rocambole úmido e fofo que me chama na cozinha.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Farmácia na cozinha

Vivo aqui neste blog incentivando o uso das ervas frescas (tão esnobadas na hora das compras), para temperar a sagrada comida do dia-a-dia. Não só pelo prazer de degustá-las, pois enobrecem toda e qualquer receita, registro aqui um pouco de seus milagres:

Tomilho – erva sagrada para os antigos, sempre inspirou os poetas pelo seu perfume exótico. Thymus deriva da palavra grega thymon, que significa coragem. O tomilho pode ser usado para limpar o organismo de impurezas, tanto físicas quanto emocionais (raiva, frustração, inveja), além de ser muito digestivo. Trata das infecções por fungos, dores de garganta e ciática.

Manjericão (alfavaca) – ótimo para combater gases, dores intestinais, apendicite, cistite, pneumonia, angina, sinusite, dores de cabeça em conseqüência de má alimentação e tonturas. Sua energia é suave e calmante.

Sálvia – excelente remédio contra o stress. Tem propriedades tônicas, diurética, anti-reumática, perfeita para higiene bucal, ajuda nas estomatites, aftas, brônquios e equilibra a diabetes.

Alecrim – revigorante e estimulante para a mente e o corpo. Bom para tosses, bronquites, reumatismos e artrites, pressão alta, dores de estômago, má digestão e cicatrização.

Erva-doce (funcho, aneto, endro, dill) – ótima para enxaqueca, vesícula e para quem sofre de angina, pois limpa veias e artérias. Também auxilia nas dietas de emagrecimento, cólicas intestinais, azia e ajuda na formação de leite em mulheres que amamentam.

Menta – contra perda de memória, stress, asmas e cólicas de origem nervosa, auxilia a digestão, é antitérmica e diurética.

Salsa – atua em todo o organismo, principalmente no fígado. É expectorante, boa para a bexiga, falta de apetite, inflamação dos olhos, pneumonia, febre, reforça a imunidade, combate hemorragias, gripes, inflamações na uretra e fortalece o baço.

Manjerona – indicada contra fraqueza dos músculos e nervos.

Hortelã – tônico indicado contra prisão de ventre, vermes, reumatismo, e também usada como calmante.

FONTES: MARIA TERESA MODRO E PROF. JAIME BRÜNING

sábado, 29 de maio de 2010

Cuscuz macio e saboroso

Não entendo cuscuz como um bolo seco de farinha de milho e alguns pedaços de legumes e ovos engessados dentro dele. Jamais. Mesmo que tenha uma decoração apetitosa, o engano dura até a primeira garfada.
Para dar sabor à esse delicioso prato, é preciso que a farinha seja cozida em um caldo cheio de personalidade, e não apenas em água quente.
Os pedaços de sardinha, palmito, ovo, camarão ou seja lá o que for, fazem parte da natureza de toda receita, mas o caldo é que deve acentuar o ingrediente principal. Por exemplo, se o cuscuz for de camarão, não só os pedaços de camarão deverão encarregar-se de espalhar o sabor para uma assadeira inteira, mas um caldo feito de sua casca deve ajudá-los. O mesmo ocorre com um cuscuz de palmito. Neste caso, um vidro do caule carnudo vai bem picadinho, e outro, batido com o caldo.
E assim acontece com os demais ingredientes e temperos: uma parte em pedaços e outra líquida - azeitonas, pimentinha, alho, cheiro verde, tomilho, champignon e o que mais combinar.
Também uso tomate pelati no caldo. E para a maciez, pasmem: quase meio vidro de azeite de oliva no final do cozimento do cuscuz. Se mesmo assim ainda estiver faltando alguma coisa, salgue corretamente, até sentir a essência de cada ingrediente, porque o sal é o verdadeiro realçador de sabores.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

O cardápio dos sentidos II

Claro, esqueci dos APIMENTADOS ou PICANTES, onde desfilariam os temperos mexicanos, baianos e tailandeses. Ou tenha me esquecido também de outras texturas e sabores a serem explorados, afinal a idéia é uma pedra bruta que, como todas, teria de ser cuidadosamente lapidada .
A discurso maluco surgiu da questão da identidade dos restaurantes. Sim, hoje trabalhamos com a cozinha contemporânea, a globalização da gastronomia, que permite a mim e a outros profissionais harmonizar temperos e ingredientes de cada canto do mundo. Logo, o cardápio, além de ter as sugestões globalizadas, poderia ir direto ao assunto cutucando o paladar do cliente e, quanto a mim, o desafio de criar pratos com um novo enfoque.
Até numa proposta mais tradicional esse formato se encaixaria. Talvez, ao invés de elegermos um prato como principal, escolheríamos com mais gosto o principal de um prato, mesmo sendo uma salada, uma sopa ou as receitinhas de uma degustação.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

O cardápio dos sentidos

Já que se fala tanto na cozinha dos sentidos, acho que se abrisse um restaurante hoje, definiria o cardápio não tanto por um segmento de comidas estranhas, mas por desejos tendenciosos do nosso cotidiano. Não tem aquele dia em que você acorda com vontade de comer algo mais adocicado ou mais ácido? Pois então.
Portanto, ao invés de elaborar um cardápio de maneira convencional como: saladas, peixes, carnes, massas, risottos e etc, faria as sugestões da seguinte forma:
CÍTRICOS-ÁCIDOS
DEFUMADOS
AMANTEIGADOS
AZEITADOS
CROCANTES
SALGADOS-DOCES
e um nome mais chique para... GORDUROSOS, onde entraria a picanha, a feijoadinha e o peito de pato.
Dentro de cada classificação as opções, seguindo a sequência acima: nos CÍTRICOS-ÁCIDOS, sugestões de molhos e temperos a base de limão, vinagre, tangerina ou sumagre.
Nos DEFUMADOS, lingüiças, costelinhas e comidas com o sabor e o perfume do bacon. Peixes que passam pelo mesmo processo, como salmão, truta e hadoque. Sopas também são convidativas com esse delicioso aroma.
Em AMANTEIGADOS teríamos muitos dos clássicos como risottos, massas e carnes gerais com os tradicionais molhos finalizados com derivados do leite.
Os AZEITADOS seriam algumas conservas, ou elaborações mediterrâneas bem leves.
Os CROCANTES estariam talvez mais presentes nas entradas, com porçõezinhas de pastéis, manjubinhas fritas, panceta ou nos pratos à milanesa.
E quem não gosta da mistura de SALGADOS-DOCES? Frutas e geléias nas saladas, nos molhos, no quente e no frio.
É possível ou não agradar a gregos e troianos? Gostamos de mexer com os sentidos do paladar, mas principalmente o de matar suas vontades.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Em defesa da coerência e da lógica

Postei em setembro de 2008 uma entrevista com Michael Pollan à Folha de S.Paulo, sobre o livro de sua autoria Em Defesa da Comida. Volto a falar aqui sobre o excelente trabalho deste jornalista, que deveria ser lido e relido por qualquer cidadão que esteja cansado da ditadura da alimentação. Michael comenta detalhadamente a industrialização da comida nos Estados Unidos na década de trinta e como essa cultura equivocada tomou conta de nossas geladeiras. E não para por aí: alerta para a busca insana da “refeição completa” através de complementos, shakes, cereais e - se o livro fosse publicado hoje - estaria também a ração humana numa listinha que poderia ser chamada de “Imitações de Comida”. Arrisca ainda: trinta anos de conselhos nutricionais nos deixaram mais gordos, mais doentes e mais malnutridos. Imperdível!

terça-feira, 11 de maio de 2010

Entre família e panelas

No dia das mães a comemoração é sempre dupla. Minha tia, que também é minha madrinha, não tem filhos. Sendo assim, se a mãe ganha presentinho, madrinha também ganha. Se a mãe ganha flores, madrinha também.
O cardápio foi especial para a data, como não poderia ser diferente: peito de pato com risotto de aspargos frescos.
Para quem não sabe, pato tem a carne avermelhada e é, na minha opinião, uma das carnes mais saborosas que existem. Fazer o magret (peito), é muito facil: ele vem com uma capa grossa de gordura, como a picanha. Basta colocar essa parte para baixo numa frigideira anti-aderente e fritar por sete minutos. Não é preciso nem um pingo de óleo, pois uma parte da gordura vai derreter rapidamente. Após os sete minutos, vire o peito e frite a parte da carne por três minutos no máximo (se passar disso, a superfície da carne ficará muito dura). Depois é só fatiar e passar na manteiga ou com um pouco da própria gordura, se quiser a carne bem passada. Mas o ideal é deixá-la rosada. Essa é a maneira mais simples de se preparar um magret, apenas ele, uma frigideira, manteiga e sal.
Alguns restaurantes o servem com vinho do porto e cassis, outros preferem molho de laranja e gengibre. E todas as maneiras são deliciosas, garanto.
Mas no meio do vai e vem de colheres e panelas, lembrei-me de um episódio da infância e fiz minha mãe puxar sua memória pra bem longe: e aquele peru que você encomendou para o Natal?
Ah, sim. A história é a seguinte. O seu Pedro granjeiro criava galinhas e vendia ovos e frango frescos. Um dia comentou com minha mãe que peru de carne escura era mais saboroso. Dois dias antes do Natal lá estava um peru perambulando pelo quintal de casa. Fazia glu glu e tudo mais. Bem, na véspera, meu avô encarregou-se de fazer o trabalho sujo e nem disso eu me lembrava direito.
De fato naquela ceia, segundo a opinião dos adultos, comprovou-se que a carne escura é mais saborosa mesmo, mas a questão que ficou foi: por que é que hoje não se vende peru de carne escura? Fui pesquisar. Surpreendentemente, descobri que no começo, a Sadia vendia os perus de carne escura e depois passou a criar apenas os de carne branca, importados dos Estados Unidos.
Existe aí o mito de que carne branca é mais saudável, mas é só mito. Parece que carne escura tem maior valor nutricional e tanto a carne escura quanto a branca contêm menos gordura do que a carne vermelha. Acho que, como tudo na cozinha, é só uma questão de estética. É claro que a carne branca agrada mais aos olhos do consumidor.

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Berinjela ao forno - receita proseada

Quadradinhos de berinjela, murchos, assados no forno baixo por uma hora e quase lá.
Nada de sal, nada de azeite, nada de acompanhamento - por enquanto. Só a berinjela em partezinhas e o impiedoso deserto.
Quando finalmente se agarrar ao chão quente da assadeira, aí então estará pronta. Ali os cubinhos estamparão a própria sombra depois de desprendidos por uma espátula.
Em secreto: curiosidade, roubo pedaços ainda virgens de artifícios, só para sentir o sabor assim, assado. Depois uma pitada de sal, e curto mais um tanto da casquinha crocante de cada cubinho encolhido (a berinjela perdeu água).
Compromisso: na tigela, hora do carnaval, lambuza com azeite, joga o vinagre de cheiro, remexe bem, pimentão amarelo, vermelho, cheiro-verde, pimenta-do-reino, um tcham e o diabo. Tá na mesa.
Reflexões digestivas: saudade do sabor que só a mim agradava, da berinjela honesta e murcha, desidratada, da casquinha crocante e a cara feia de sofreguidão de forno.

domingo, 25 de abril de 2010

O abacaxi

E então a vontade e a preguiça duelavam. A vontade queria criar e traduzir um abacaxi.
A preguiça pronunciava derrota, mas o desafio é quem lhe mantinha a vida:
Vontade: o abacaxi é a expectativa da carne doce
Preguiça: não sei de nada
Vontade: fruta-carne, líquida e cortante
Preguiça: isso não me interessa
Vontade: em toda sua amarelice se esconde o mel
Preguiça: ...
Vontade: lá dentro de sua roupagem coroada
Preguiça: brinque sozinha
Vontade: a doçura se revela de acordo com seu humor
Preguiça: bah!
Vontade: e na cabeça carrega a Carmem Miranda
Preguiça: definitivamente não quero falar sobre isso!
Vontade: já fez do seu néctar um perfume natural?
E a curiosidade moveu a preguiça do lugar.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Não pode mesmo?

Um certo chef de cozinha andou pregando por aí que temperar peixe com alecrim é um verdadeiro “assassinato” para o paladar. E que coentro não pode ser usado em massas. E que gringos acham essas combinações muito estranhas.
Vamos começar de trás pra frente. Um: desde quando temos que agradar ao paladar dos gringos? Então, o que faremos com o feijão preto, o torresminho e a farofa com banana frita se eles não gostarem?
Dois: a Cozinha Contemporânea me permite criar pratos harmonizados com temperos do mundo todo. Não posso colocar coentro em uma massa? Onde fica nosso regionalismo? E se eu quiser abrasileirar uma receita de sangue italiano, como um belo nhoque de abóbora com suave ragú de carne seca? Não posso mesmo adicionar coentro para completar o dueto?
Três: imagine um peixe branco, de filés altos e saborosos, fresquíssimo, se debatendo na ponta do anzol, saído das águas de um rio gelado agorinha mesmo, sendo assado numa cama de ervas frescas e, entre elas, um ramo de alecrim.
Meu filho, me poupe. O mundo anda tão nervoso. Vá se preocupar com outras coisas! Falar que não se deve colocar alecrim em peixes é demais da conta!

sábado, 17 de abril de 2010

Safra boa

Esta semana, tive a maior surpresa em termos de festa de formatura dos últimos anos, ao prestigiar a turma matutina de Direito da Pucc Campinas.
A estrutura toda, desde o cerimonial até a banda que animava o público, veio de Bauru, da Impacto Ticomia Eventos e Formaturas, nome tão despretensioso e confuso quanto o site – e apesar disso, durante o evento nos passam a sensação de que conseguimos o universo aos nossos pés se apenas solicitarmos a eles.
A região de Campinas que se cuide! A organização toda da festa era digna de um casamento, que quase colocou os que presenciei abaixo do chinelo.
O talentoso chef Giovani dos Santos assina o cardápio do Buffet Comiato, parte integrante da empresa de eventos. Nada do que foi servido era parecido com salgadinhos de recheios suspeitos ou qualquer coisa com consistência e cara de Maisena pra enganar a gente. Nada de molhos ralos, de quatro queijos com gosto de mussarela derretida ou de canapé com paté sabe-se lá do quê. Nada de escassez ou de garçons ocupados demais.
Apesar de terem sido muito modestos em postarem no site apenas fotos de mesas de frios e barcas de sushi, não me esquecerei da saladinha oriental que degustava enquanto a galera pulava na pista ao som de Y.M.C.A., ou da bolinha de queijo empanada com gergelim, coberta com calda suavemente caramelizada ao ritmo de It’s Raining Man. E o carpaccio de palmito pupunha na hora do I Will Survive? Bem, não deixei escapar nada do gostinho que a festa inteira me proporcionou. Trouxinhas de massa phyllo cheias de personalidade, mousses de sabores fortes e delicados harmonizando temperos e ingredientes, creme de aspargos de verdade e outras sopas honestas e um incrível queijo Brie gigante derretido à minha inteira disposição - e outros tantos à disposição dos oitocentos convidados. De fato havia fartura. Aposto que os que pagaram pela festa não se arrependeram de nenhum centavo.
Antes mesmo do Rebolation já havia ido embora e feliz da vida. Como o mundo é bom!

Como se não bastasse o êxtase atingido na festa, no dia seguinte estava na Confeitaria Coimbra atrás dos croissants de chocolate, especialidade da casa, ainda desconhecida na minha opinião. Mas haviam acabado. Um monte de papos-de-anjo mergulhados na calda transparente imediatamente me chamaram da vitrine, sem que desse tempo de eu me entristecer com a falta dos croissants. Foram pelo menos três papos que acompanharam meu café, com uma boa justificativa: na noite anterior deixei a festa antes da sobremesa.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Tomilho, um caso de amor

É quase difícil convencer as pessoas a usarem alecrim fresco no lugar do seco. Que dirá inserir na comida rotineira uma erva pouco conhecida na intimidade, como o tomilho. Geralmente, as ervas frescas representam uma barreira na hora da compra, por um único motivo, pelo menos unânime entre alunos e conhecidos meus: não saber como usá-las.
Eu digo que do mesmo modo que se abre um maldito tablete de tempero artificial e o joga na panela, pega-se uns ramos da erva escolhida e faz o mesmo. Mas ervas frescas combinam com o quê? Com tudo, acredite. Deixo abaixo algumas dicas sobre elas, mas antes quero falar um pouco mais sobre o tomilho, meu tempero secreto.
Não quero discorrer aqui suas propriedades ou sobre qual família pertence, pois esse blá blá blá nunca é lembrado no momento em que apreciamos o sabor do prato acompanhado de um bom vinho, estando sozinho ou rodeado de amigos.
Durante o cozimento, o tomilho pode ser usado inteiro, como um ramo, e depois retirado, seja em ensopados ou sobre os assados, somente para que os ingredientes absorvam seu perfume. Ou ainda, as folhinhas podem ser destacadas do caule e fazerem parte do prato, mesmo ao natural e como decoração.
Como adoro aves assadas (frango, peru, chester, galinha d’angola, pato, codorna e etc), gosto de preencher o interior da carcaça com os galhinhos dele. Na hora de servir basta descartá-los, porque todo o sabor já ficou fixado na carne. Peixes também formam uma boa parceria com o tomilho.
Ratatouille, a clássica mistura francesa de cebola, tomate, abobrinha e berinjela é uma receita engrandecida especificamente por causa de seu aroma. O mesmo efeito hipnotizante acontece quando cozido com lentilha, calabresa e bacon, tudo na mesma caçarola.

Aqui vai um resuminho prático sobre o uso das ervas frescas (frescas, lembre-se!) na comida do dia-a-dia, sem medo de ser feliz:

TOMILHO, ORÉGANO, CEBOLINHA, SALSINHA, MANJERONA E ALECRIM – aves, carnes bovina/suína/caça, peixes, frutos do mar, massas, verduras e legumes
MANJERICÃO – embora combine com tudo, melhor não cozinhar e jogar as folhinhas sobre o prato na hora de servir. Mas vai muito bem quando assado na pizza em forno alto.
ENDRO (dill) – principalmente peixes, legumes e verduras
NIRÁ - carne bovina, peixes, frutos do mar, legumes e verduras
HORTELÃ – Frutas, saladas e pratos árabes ou libaneses

domingo, 4 de abril de 2010

Cartão de Páscoa


Um projeto

Paulinho chegou na frente da vitrine de doces e olhou alguma coisa que não compreendia. Era um cilindro de chocolate com desenhos delicados em relevo na volta toda. O recheio ficou na imaginação - e até então essa era a melhor parte do doce. Na superfície, equilibrava-se alguma coisa parecida com um pedaço de renda engomada, cor de creme. Era de comer? Enquanto a imagem do menino refletia no espelho interior da vitrine, aquele doce crescia em seus olhos vitrificados. Um homem aproximou-se do balcão de confeitos e olhou com curiosidade e respeito para o garoto descalço. Como as oportunidades aparecem, tanto para os mais afortunados quanto para os menos, Paulinho não deixou escapá-la de suas mãos: Moço, me paga um doce? O homem respondeu-lhe com outra pergunta: Você quer aprender a fazer doces? 10 anos depois, Paulinho ganhou um prêmio de melhor confeiteiro da cidade.

Eu tenho alguns sonhos. Além de criar codornas em uma futura fazenda, queria montar uma cozinha-escola para jovens carentes. Faltam profissionais capacitados na área da culinária/gastronomia - os donos de bares e restaurantes não me deixam mentir. É preciso apoio, patrocínio, local e estrutura. O mercado está pronto para recebê-los, no mínimo, como estagiários. E quem é bom, fica. Está lançado oficialmente um projeto. Alguém se habilita a abraçar a causa?

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Blog novo no pedaço

A amiga e jornalista Michele Medola é boa de papo e de garfo. Sendo assim, não podia deixar de fazer um blog contando suas peripécias gastronômicas, o Papa Fina. E se o leitor morar na região de Campinas poderá acompanhar as dicas e broncas registradas por ela.

terça-feira, 30 de março de 2010

Que Amélia é essa?

Amélia picava cebola e chorava. E também chorava porque picava a cebola. Não se dava ao luxo de fechar os olhos, nem sabia o que era ter um luxo. Não achava poesia em não ter o que comer - poesia ela sabia o que era. A cebola ardia nos olhos, enquanto a dor gerava uma nascente de águas salgadas, que brotavam, parecia, do coração, separavam-se nos canais lacrimais e encontravam-se novamente do lado de fora, bem na curvinha do seu queixo. Sabia que tudo passava e que tudo continuava, como os dias, as semanas, os anos. Mas sonhava com um fim. O início não importava, não fazia parte de nenhuma história.
Seu único consolo, lembrava frequentemente, é que as heroínas das histórias que conheceu não escaparam de sofrimento algum. Foram condenadas por coragem, persistência, indignação ou sensibilidade. Então entendia que a vida tem um preço e um valor; que a vida se paga com a própria vida. Prato do dia: arroz com cebola.

quinta-feira, 25 de março de 2010

Aula Aberta - Palestra

COZINHA PROSEADA E O MUNDO DA GASTRONOMIA
chef Regina Bui
Onde: Espaço Cultural Era Uma Vez
Quando: 29/03/2010
Horário: 19:30 hs
Todos serão bem vindos!

segunda-feira, 22 de março de 2010

Um carneiro chamado Pulôver

Pela primeira vez na vida ajudei a tosquiar um carneiro, o Pulôver. Foi emocionante a aventura, tão longe de minha realidade. Logo na semana que antecede meu aniversário, me encontro renovando uma capa encardida e velha (fazia mais de um ano que o Pulôver não era tosquiado), do animal que me representa no zodíaco.
Um verdadeiro alívio, tanto para mim quanto para ele, arrancar com um tesourão o casaco grosso e pesado que o enchia de calor. E depois, ele ficou muito mais jovem. O contato com um animalzinho desses, que não vemos assim em qualquer lugar e a todo momento, é de apertar o coração de alegria. Geralmente alegria não faz com que o coração fique apertado, mas acho que o leitor entendeu o que eu quis dizer.
No mínimo, explorei as sutilezas da lã bruta e macia, cruzei o olhar indefeso do bichinho assustado, conheci um outro cheiro daquele que estou acostumada em minha cozinha. Oh, céus! O inventor das emoções compartilha delas conosco? Ao mesmo tempo que acho que não deveria ter sentido o Pulôver tão de perto, fiquei imensamente grata pelo que considerei ser um presente de aniversário, tão fofa - literalmente -experiência.
Vida longa à mim e ao Pulôver – e à ovelhinha negra que pulava no meio do seu bandinho!