DISCURSOS GASTRONÔMICOS E MACARRÔNICOS

terça-feira, 31 de agosto de 2010

Alimentação infantil é coisa pra lá de séria

Já que falei de crianças nos posts anteriores, quero aproveitar a carona e publicar o texto do último boletim da nutricionista Ana Ceregatti, alertando para os problemas da alimentação  infantil. Não é incomum presenciarmos, seja lá onde for, crianças com pacotinhos de bolachas e salgadinhos nas mãos, o que parece ser uma maneira fácil e prática, porém perigosa, de agradá-las ou alimentá-las.
Vale a pena também conferir o site da profissional, que possui consultório em São Paulo e atenderá em breve em Campinas: http://www.anaceregatti.com.br.

"MAMÃE, COMPRA BRÓCOLIS?"
Sonho de consumo de muitas mães, essa frase ficou famosa por ter sido dita de maneira bem divertida em um comercial de TV. Mas, na vida real, alguém já viu uma criança fazer escândalo para conseguir um ramo de brócolis? Ou uma negociação constante entre mães e filhos nos corredores dos supermercados é uma visão mais comum – para não falar daqueles escândalos típicos da criançada, que nos deixam sem saber o que fazer?
O que de fato acontece para as crianças rejeitarem tanto os verdinhos e adorarem os “porcaritos”? Há dois aspectos a considerar: o que é da natureza humana e o que se aprende no mundo.
Para começar, vale dizer que o sabor doce vem de fábrica, ou seja, nós nascemos com esse sabor identificado. É instintivo. Os demais, como o azedo, o salgado e o amargo, serão desenvolvidos conforme a criança for experimentando os alimentos.
Mas esse processo não acontece somente quando os pequenos começam a comer papinhas, perto dos 6 meses. Ele tem início nas primeiras horas de vida, através da amamentação, quando o bebê entra em contato com diferentes sabores e aromas presentes no leite materno, formados a partir da alimentação da mãe.
Outra ajudinha que a natureza dá de presente é a variação natural de sabor que o leite humano tem com o passar dos meses. À medida que a criança vai crescendo, a quantidade de lactose (açúcar do leite) vai diminuindo e o teor de cloretos vai aumentando, tornando o leite levemente salgado, preparando o paladar do bebê para o que vem pela frente.
Infelizmente, quando a criança é alimentada com fórmulas infantis – que têm sempre o mesmo sabor – esse aprendizado não acontece da mesma forma. Nesse caso, a única opção é trabalhar o processo de aprendizagem através de exemplos e de rotinas, com uma grande pitada de bom humor, paciência e perseverança. Só assim poderemos garantir que o brócolis não perca para sempre seu lugar para a batata frita!
Mas não importa se o pequeno mamou ou não no peito: ele vai aprender a gostar dos alimentos que lhe são oferecidos com mais freqüência e passará a preferi-los da maneira como lhe foram apresentados na primeira vez. Por isso, se desde o início a criança for acostumada a comer alimentos contendo muito sal, açúcar e/ou de gordura, ela carregará essa preferência para a vida adulta e tenderá a rejeitar alimentos mais saudáveis, que naturalmente contêm menos sal, açúcar e gordura. A variedade de cores, sabores e textura ganha então especial destaque.
Outra coisa importante: as caretas que a criança faz quando experimenta algo pela primeira vez, especialmente quando são bem novinhas, não significam que ela não gostou do que provou. Um único contato não é suficiente para desenvolver a rejeição pelo alimento.
Para os mais crescidinhos, que insistem em não comer (para o desespero das mães!), vale dizer que as atitudes e comportamentos do responsável pela alimentação da criança têm grande influência sobre seus futuros hábitos.
Chantagens, coações ou subornos podem até aumentar a rejeição pelo alimento. Pior ainda são as moedas de troca. Frases do tipo “se comer tudinho, vai ganhar uma balinha” são ótimas para atrapalhar de vez a construção de bons hábitos alimentares. Nesse caso, o mais grave é que esses alimentos são considerados pobres e inadequados do ponto de vista nutricional, por conterem excesso de calorias, açúcar, gordura e sal, grandes vilões na saúde de jovens e de adultos.
Os responsáveis pela alimentação também precisam dar o exemplo. Dificilmente uma mãe fará o filho comer brócolis – ou qualquer coisa do gênero – se ela não tem o hábito de consumir esse tipo de alimento. A criança pode pensar (e com razão): por que eu tenho que comer isso se nem minha mãe come?
E o oposto também é verdadeiro: não adianta proibir a criança de comer “tranqueritos”, como refrigerantes, salgadinhos, doces, lanches, chocolates, bolachas, balas e afins, se os pais ou responsáveis fazem disso a base da sua alimentação!
Então, como proceder para um dia ouvir seu filho pedir brócolis e ficar hiper feliz se em troca você der um rabanete?
Além das dicas acima, vale rever os hábitos alimentares da família, buscando por produtos mais naturais e vivos, como as frutas, verduras, legumes, cereais e feijões. Como muita gente vive na cidade grande, sem acesso a alimentos colhidos na hora, tendo como única opção os supermercados e feiras, o ideal é comprar alimentos minimamente processados – porque industrializados o arroz, o feijão e o sal também são!
Evite alimentos prontos, que só precisam de 5 minutinhos no microondas, ou que contenham um caminhão de aditivos alimentares. Leia rótulos: se não conseguir entender ou repetir o que está na embalagem, não compre!
Evite também alimentos que contenham gordura vegetal hidrogenada ou margarina, sinônimos de gordura trans, como pratos prontos, bolachas (até aquelas de água e sal, que muita gente come quando está de regime, tem trans), bolos, pipocas para microondas, sopas de pacote, salgadinhos, enfim, tem tanta coisa que é feita com gordura hidrogenada que ficaria muito longo citar tudo. Busque esse componente na lista de ingredientes, mesmo se na embalagem estiver escrito 0% de trans.
Ensine a criança a comer frutas, verduras e legumes, sem escondê-los no meio de outros alimentos.
Monte uma lancheira saudável: bolos caseiros, pãezinhos (sem gordura trans) com geléia ou pastinhas ou bolachinhas integrais, acompanhado de frutas frescas ou secas (ameixa, uva passa, bananinha) e mais um suco, preferencialmente natural ou de caixinha que não tenha corantes e açúcar.
O mercado dispõe cada vez mais de opções integrais e orgânicas, com o mínimo necessário de aditivos alimentares e sem trans. Vale investir um tempo para pesquisar as gôndolas dos supermercados.
Uma criança saudável, bem nutrida, feliz e com peso adequado será um adulto mais em paz com suas emoções e com o seu corpo!

Um comentário:

Isabel Hargrave disse...

Entendo pouco de nutrição, então meu olhar sobre a alimentação das crianças se volta sempre para a educação. Estamos cansados de ver pais fazendo a maior cara de feliz e dizendo "Olha só, filho! Hoje tem salsicha e batata-frita!" e no dia seguinte "anda, come seu brócolis, tem que comer tudo!", ou seja, transmitindo a idéia de que o legal é o não-saudável. Raramente presenciamos um adulto dizendo para a criança que o espinafre está uma delícia e que é um privilégio para ela poder disfrutar desse alimento. Felizmente eu conheço uma criança que briga com os pais porque gostaria de comer "só a salada, sem a carninnha", hehe!